sábado, 21 de abril de 2018

8 - A perfeição do amor (1 Jo 4,11-5,4) – Ler na Bíblia.


 O amor recíproco
Os versículos de 4,11 a 5,4 da primeira carta de João constituem a sesta dos sete pericopi na qual a carta pode ser sub dividida. Se trata na realidade da segunda parte de uma pericope mais extensa, que parte do versículo 3,23 e é estreitamente conexa ao texto que agora tomamos em consideração. Também para este trecho pode ser útil um esquema que pode escandir um tríplice desenvolvimento do texto: a um anúncio (4,11) fazem seguido de um momento de exortação para viver o que o anúncio propõe (4,21) e os critérios de discernimento afim de que o anúncio possa ser concretamente vivido, os quais ocupam os restantes versículos.
«Caríssimos, se Deus nos ama, também nós devemos amarmos uns aos outros» (4,11). Se trata de um tema muito caro para o autor da primeira carta de João: a recíproca interdependência entre o amor de Deus e o amor pelos irmãos. Notemos que, assim como em diversos outros passos da carta no qual é chamado à exigência do amor recíproco (1Gv 1,6-7; 2,5; 3,11; 3,23; 4,7, como também em Jo 3,14), também aqui a comunhão com Deus e com os irmãos não tem um sujeito nem como seu ponto de partida nem com seu ponto de chegada. A atitude que é recomendado em resposta ao amor de Deus por nós – amor que sempre nos precede – não é convite para amar por nossa vez a Deus, e nem simplesmente para amar o próximo. Isto significa que o coração pulsante de ágape (termine como o qual o Novo Testamento indica o amor desinteressado e oblativo) não é o amor de qualquer um para outros qualquer. Este sentido é certamente contido na ideia de ágape, mas não é este que deve ser levado à perfeição. Realmente, como faz notar Bruno Maggioni, na carta se fala muito de amor de Deus e de amor fraterno, sòmente em 4,21 e em 5,2 se fala do nosso amor para com Deus. Se diria que João receie aquele tipo de vida religiosa que se dirige diretamente a Deus sem passar através do concreto da praxe quotidiana .
«Se nos amamos uns aos outros, Deus permanece em nós e o amor dele é perfeito em nós» (4,12) e ainda mais adiante: «Nisto o amor alcança entre nós a sua perfeição: e temos plena confiança no dia do julgamento, porque tal como Jesus é, assim somos também nós, neste mundo» (4,17). A perfeição do amor é certamente possível, ou melhor, é a meta a qual tende toda a vida do discípulo, como nos recorda também São Mateus («vós, portanto, sejam perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste»: Mt 5,48), mas ela não consiste em levar a perfeição a capacidade de amar como qualquer um: isto de fato seria ainda fruto de um esforço pessoal. Perfeita deve ser ao contrário, a reciprocidade no amor, uma reciprocidade não fechada em se mesma, mas capaz de expandir-se sempre mais além, envolvendo no seu circulo de amor sempre novos irmãos e irmãs. A este propósito, estão iluminando as palavras de um autor do século XII, Riccardo di San Vittore, que no seu tratado sobre a Trindade escreve:
Pois bem, na caridade autêntica o Máximo da excelência lembra que seja isto: querer que um outro seja amado como o somos nós mesmos. Com efeito, no amor recíproco e ardente nada é mais precioso nem mais admirável do que o desejo que um outro seja amado do mesmo modo daquele que sumamente se ama e daquele que se é sumamente amado. Portanto a prova da caridade perfeita consiste no desejar que o amor do qual se é objeto seja participado.
Isto significa que é fundamental antes de tudo preocupar-se de ter feito todo o possível para que o próprio irmão possa crescer no amor. Muito ao contrário, se é excessivamente preocupados pelas próprias disposições pessoais do que pela benevolência para com o outro. Se sente, por exemplo, sugerir muito como princípio espiritual a máxima segundo o qual cada um deveria preocupar-se unicamente pela própria conversão pessoal, sem julgar os outros. Parece na realidade que o texto de 1Jo se leva para mais além: se é chamados de fato a preocupar-se pelo estado do próprio irmão não para libertar-se de um sentimento de culpa, ou para sentir-se justificados, para ter todas as contas saldadas, ou pior ainda, pela presunção de saber onde é bem que o outro se escorrega. A única razão que me pode levar a preocupar-me pelo outro é a consciência que o meu crescimento no amor e o do irmão dependem um do outro, ou melhor, um não si dá sem o outro. A ideia de perfeição apresentada no nosso texto não coincide por isso com uma pretensão de ser sem mancha, sem imperfeição, limites ou incriminações, e nem mesmo sem caídas. O amor verdadeiro, perfeito, corre sempre risco, comprometimento; se acolhermos o desafio de amar, antes ou depois o mínimo que nos possa entender é de sujarmos as mãos, se não até de feri-las. Então a perfeição não será nada mais nada menos do que a confiança de estender aquelas mãos sujas, feridas, e esperar com paciência e fidelidade que seja o próprio Jesus a lava-las e a curá-las através das suas próprias feridas: «pelas suas chagas nós somos curados» (1Pt 2,24).
«Ninguém jamais viu a Deus»: significa que não si pode pretender ver Deus por conta própria! A busca de Deus quanto mais é íntima, personalíssima, as vezes quase indizível, e muito mais deve ter um respiro eclesial. Só graças à profundidade do olhar de um irmão, de uma irmã, da própria comunidade «se conhece que nós permanecemos nele e ele em nós» (4,13). Este “permanecer em Deus” é descrito por João como real participação na própria vida de Deus Trindade, porque ela tem como seu término de no fato que «ele nos deu o seu Espírito» (4,13). O Espírito Santo, dom do Pai e do Filho, é portanto dado afim de que a própria íntima relação que lega as Pessoas da Trindade possa ser o princípio da nossa relação pessoal com Deus e da comunhão com os irmãos. Sem dúvida é a preciosa expressão «Deus é amor» (4,16), única pela sua gravidez em toda a Sagrada Escritura, para constituir o vértice da meditação sobre Deus ágape. Assim Bruno Maggioni comenta: com esta frase João não faz mais do que reassumir o quanto a história da salvação continuamente testemunha: Deus escolhe, perdoa, permanece fiel ao seu povo apesar das traições, e em Jesus Cristo se manifesta como amor que se doa e se deixa crucificar. A preciosa afirmação de João deve ser lida com toda esta densidade.
A participação na vida trinitária impede também de cair no risco de uma lógica “funcionalista”, a qual poderia conduzir a uma leitura não advertida do texto: tal lógica exigiria o amor pelo irmão como passagem obrigatória para alcançar o amor por Deus, come se fosse uma espécie de preço à pagar, necessário, mas de qualquer modo transitório, e uma vez alcançada a meta da comunhão com Deus, o relacionamento com o irmão não nos interessam mais. João afirma ao contrário com clareza que os dois polos, amor de Deus e amor pelo irmão, estão ou caem juntos: amadurecer no amor não significa utilizar um dos dois para conquistar o outro, mas acolhê-los ambos – e juntos – como dons gratuitos. Exemplificando, parece poder dizer então que é necessário passar de uma lógica funcionalista a uma lógica circular e de participação.
A bem ver, a própria estrutura do texto reproduz no estilo esta “circularidade em expansão”: o autor não teme repetir muitas vezes, mesmo em brevíssimas distância, os mesmos conceitos ou reformulá-los com palavras semelhantes. Já dentro dos poucos versículos da nossa pericope é possível localizar esta rede de contínuas notas e chamadas. No v. 4,12 se diz que «se nos amamos uns aos outros, Deus permanece em nós e o amor dele é perfeito em nós», logo reforçado no v. 4,15: «quem confessa que Jesus é o filho de Deus, Deus permanece nele e ele em Deus» e no v. 4,16: «Quem permanece no amor permanece em Deus e Deus permanece n’Ele». A exortação ao amor recíproco, expressa em forma mais concisa nos v. 4,11 e 4,12, é especificada e ampliada nos v. 4,20 e 4,21, lá onde se mostra a contradição de quem diz amar a Deus que não vê, mas nutrindo sentimentos de ódio para o próprio irmão que vê. A mesma ideia em forma reversa é apresentada pouco mais adiante no v. 5,2: «nisto conhecemos que amamos os filhos de Deus: quando amamos a Deus e observamos os seus mandamentos». Por último, a confissão de Jesus como Filho de Deus, condição para que Deus permaneça em nós (v.15), retorna no início do capítulo 5, onde vem integrado com o tema da geração de Deus: «quem crer que Jesus é o Cristo, nasceu de Deus». Enfim a «confiança no dia do juízo» (v. 4,17) constitui o caminho de acesso para aquela «fé que venceu o mundo» (v. 5,4) que sela a nossa testa. Se trata realmente daquele acontecimento que deveria fazer do fundo de toda a vida do cristão: o de uma confiança (parresìa) capaz de expulsar todas as vezes os temores que nos paralisam, de distanciar e relativizar os nossos medos, os nossos bloqueios, para que nos torne intimamente persuasivas, para usar as palavras de João da Cruz, que “no final da vida seremos julgados unicamente pelo amor”.

Para continuar a riflexão
Quais são as dificuldades concretas que encontro no caminho de acolhimento daqueles irmãos/irmãs com os quais sinto mais dificuldade em relacionar-me?
Quais os acontecimentos na minha vida de discípulo do Senhor que dizem o meu desejo de crescer no amor para Dio e para os irmãos? Quais os acontecimentos que contradizem este desejo?
Quais os temores, medos, rigidez que têm o poder de cansar o meu caminho de seguimento? Consigo entregar-lhe com simplicidade e confiança a Aquele que pode cuidar de mim?


Nenhum comentário:

Postar um comentário