sábado, 21 de abril de 2018

5 - Nascidos de Deus (1 Jo 2,29-3,10)


 Gerados do Pai
«Se sabeis que Jesus é justo sabereis também que quem pratica a justiça, como Ele foi gerado pelo Pai» (2,29).
Segundo o esquema que nos guia, a quinta sessão em início em 2,29 no momento em que o Autor introduz o tema da geração do crente em Deus. Tal tema é o anúncio específico desta sessão, a palavra maravilhada sobre Deus que o revela como Pai rico e grande no amor (3,1); e o revela Pai atento e desejoso de estabelecer uma ligação estável com o discípulo fiel, que a tal manifestação vem constituido como filho.
O tema da geração não é porém isolado: é ligado a da justiça e os dois são postos em relação com a revelação de Jesus: quem pratica a justiça, estes como Jesus é gerado. Assim para o Autor da carta, o discípulo é aquele que conserva em se o desejo de ser justo conformando-se com a justiça de Jesus, como todo o capítulo 2 tinha expressamente sugerido e indicado: Quem diz que permanece nele (Jesus), deve também ele comportar-se como Jesus se comportou (2,6). Esta semelhança com Jesus manifesta ao discípulo a possibilidade de renascer filho mediante a fé e as suas obras, e isto mesmo pela possibilidade oferecida pelo Pai como dom: Quem nega o Filho, não possui também o Pai; quem professa a sua fé no Filho possui também o Pai (2,27).

Como Filhos de Deus
«Vejam que grande amor nos deu o Pai de sermos chamados filhos de Deus» (3,1a).
Enquanto a primeira parte da carta (1,1 - 2,28) era guiada pela simbologia da luz – Deus é luz e n’Ele não existe trevas alguma (1,5b) – nesta sessão o referimento principal é o amor do Pai que busca a semelhança e nos torna filhos. Vos tendes no início do capítulo terceiro um olhar admirado – quase um impulso místico – que possui uma abertura escatológica, só capaz de conter o desejo de Deus sobre nós e para conosco: «Carissimos, nós desde agora somos filhos de Deus, mas o que seremos ainda não é revelado. Sabemos porém que quando ele (o Pai) se manifestar, nós seremos semelhantes a ele, porque o veremos assim como ele é» (3,2).

Filhos, sem pecado, porque a unção do Santo permanece em nós
Com simplicidade nos agrada sublinhar estes três aspectos:
1.              Filhos. João nos diz antes de tudo que no coração de Deus não existe um pedido, mas uma oferta; para Deus não se trata de exibir um mérito, porque o seu amor é dom, é realidade pessoal e íntima para reconhecer, acolher e sentir. São Benedito - verdadeiro discípulo do Reino - exprime esta compreensão do Evangelho quando na sua Regra afirma que nada deve ser anteposto ao amor de Cristo, isto é nada deverá preceder, por importância em nós, respeito à percepção fontal de ser destinatários do amor divino. Crer então não é só conhecer que Deus existe e que se revela (ou conhecer o que revela), mas re-conhecer uma predileção e eleição, aquela do Pai, que protege, edifica, permite subsistir. Toda realidade é intrinsecamente filial. Esta é uma esperança que está escrita no profundo do nosso eu (por obra do Espírito Santo) e espera que se cumpra em uma comunhão vital: «Quem tem esta esperança nele, purifica-se a se mesmo, como ele é puro» (3,2).

2.              “nele não existe pecado”. Na Escritura o tema amartiologico (do pecado) tem uma notável importância. Deus vem ao encontro do homem e o liberta do mal e do pecado: «Vós sabeis que ele se manifestou para tirar os pecados e que nele não existe pecado» (3,5). A carta de João como as outras, não pretende colocar no centro a ação contra o pecado, mas quer mostrar com clareza o que impede a experiência espiritual: é o pecado que falsifica a relação filial. João neste capítulo terceiro sublinha a responsabilidade do discípulo: Quem comete o pecado, comete também a iniquidade, porque o pecado é a iniquidade. Não existe na carta uma explicação etiológica do enigma do mal mas se afirma que nesta luta contra o pecado (é o diabo que  é o inspirador) o discípulo fiel não está só: «Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo» (3,8b). Existe Jesus, o Filho, que precede os seus na luta e abre (vitorioso) a esperança da vitória. Mais uma vez emerge o tema do dom e do primado do seu agir.

3.              A unção do Santo e a Palavra em nós. «Quem é gerado por Deus não comete pecado, porque um germe divino permanece nele» (3,8). Com esta bela imagem da origem em via de crescimento na vida do discípulo, o autor da carta fala ao mesmo tempo de duas realidades distintas, mas por sua natureza comunicante: da não pecabilidade, entendido como resistência e luta com o espírito do mal e da Palavra, a qual, presente no coração sempre por meio do Espírito, cresce e se enraiza até levar o seu fruto. O Autor quer mostrar como a ação do Espírito é discreta mas eficaz: valorizando o pouco e o possível cria amigos de Deus, filhos reconhecidos que, como o Pai deseja, vivem pouco a vez – como acontece com o sábio desenvolvimento da natureza – aquela trasformação de si até à plenitude da própria identidade filial. O olhar é profondamente escatológico, mas não astorico ou banal; é ao contrário olhar frágil, mas convicto sobre a realidade de Deus que retoma o seu lugar no mundo. La pericope se encerra com a confiança: toda vez que se vê o amor fraterno entre os homens, esta visão do mundo se faz caminho de modo humilde mas eficaz.

 Para continuar a reflexão
O seguimento de Jesus nos toca no íntimo, tornando-nos responsáveis pela verdade de um percurso de purificação do pecado. Me interrogo então sobre o meu caminho, sobre os impulsos que me animam e sobre as fadigas que me reprimem. Procuro fazer com clareza, mesmo se a vezes isto me assusta e me embaraça. Me pergunto: quais as escolhas ou quais as não escolhas que faço na minha vida de fé? Qual o discernimento que faço sobre o que me aproxima e sobre o que me distancia do Senhor?

A Primeira Carta de João anuncia o amor “imenso” com o qual Deus ama a me e as pessoas que fazem parte da minha vida (em diversos níveis e graus) e enfim todos os homens. Do mesmo modo se o anúncio do Evangelho é sempre válido, é verdade todavia que em nós todos existe um esquecimento, quase uma dúvida presente no coração que afirma: eu não mereço a atenção de Deus, eu não mereço o amor de Deus, eu não tenho necessidade. A mesma dúvida grita em alguns momentos da vida: eu não sou capaz de amar gratuitamente, não vale a pena, não consigo empenhar-me para o bem e ninguém me merece. Cada um sente e vive esta voz de modos diferentes e com tonalidades diversas que trazem origem da própria história pessoal, das vidas familiares e relacionais. João nos convida a purificar o coração e a crer em Deus confiando na Sua fidelidade: ela é a rocha sobre a qual é possível fundar-se. Deus é confiável. A que ponto está o meu caminho pessoal cuidado para a aceitação do amor de Deus e para a gratidão que me põe em relação filial com ele?

Me interrogo enfim sobre as minhas disposições interiores e sobre como posso deixar-me trasformar por Deus na minha realidade quotidiana. Ponho um olhar sobre o terreno interior no qual cai a Palavra e leio os sinais da ação do Espírito a partir dos sinais concretos de confiança que concedo ao olhar de Deus em me?

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