sábado, 21 de abril de 2018

7 – Fé, Amor, Discernimento (1 Jo 3,23-4,10) – Ler na Bíblia


Uma alegre notícia
O que existe no coração do Evangelho? O que é verdadeiramente notícia alegre para nós? No seu relato, o evangelista João traz esta palavra de Jesus aos discípulos, pronunciada na intimidade da última ceia: «Este é o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como eu vos tenho amado» (Jo 15,12). O reconhecer ser amados incondicionalmente e gratuitamente pelo Senhor Jesus aparece ao amor recíproco e este se torna o espaço concreto no qual se verifica e si testemunha o próprio amor de Cristo. Esta troca de amor não é só uma experiência que somos chamados a fazer para viver como discípulos de Cristo. É um “mandamento” que o próprio Senhor dá como exigência fundamental da aliança, como empenho quotidiano de resposta à vontade de Deus. E é isto que permite aquela fidelidade quotidiana necessária para guardar em si o amor de Deus. Viver e guardar o mandamento do amor significa permanecer no amor de Cristo e através dele, abrir-se para o amor do Pai. Então João o recorda com estas palavras de Jesus: «Como o Pai me amou, também eu vos tenho amado. permanecei no meu amor. Se observares os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, como eu tenho observado os mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor. Vos digo estas coisas para que a minha alegria esteja em vós e a vossa alegria seja plena» (Jo 15,9-11). Aquele mandamento que Jesus dá ao discípulo, o amor recíproco como reflexo do amor trinitário, é o que conserva a vida do fiel, a enraíza na própria vida de Deus e comunica a alegria. É verdadeiramente o coração do evangelho.
João retoma tudo isto no capítulo 3 da sua primeira carta: «Este é o seu mandamento: que creiamos no nome do seu Filho Jesus Cristo e nos amemos uns aos outros, segundo o preceito que nos deu. Quem observa os seu mandamentos permanece em Deus e Deus n’ele. Nisto conhecemos que ele permanece em nós: pelo Espírito que nos tem dado» (1Jo 3,23-24). As duas dimensões da “regra” do cristão, o conteúdo do mandamento (o preceito que o Senhor nos deu), se revelam como aspectos inseparáveis, um do outro, um se firma no outro, um complementa no outro: a dimensão vertical que se exprime e si atua na fé em Cristo e a dimensão horizontal, que se vive nos relacionamentos de amor recíproco na comunidade dos irmãos. O crer e o amar se compenetram e se tornam o ato fundamental com o qual o fiel testemunha Cristo.

Crer no nome de Jesus
Mas o que significa crer? O que significa amar? Crer não é somente adesão da inteligência a uma verdade revelada. João fala de «crer no nome do Filho», no nome de Jesus Cristo. Crer é entrar em comunhão profunda, numa confiança e num abandono total com Aquele que nos revela o próprio mistério de Deus, o seu amor por nós, o seu nome de Pai. Crer é entrar em relação com um “nome” que contém em si todas as promessas de Deus, com um olhar que nos manifesta o mundo de Deus. esta fé nos abre o conhecimento de Deus, um conhecimento que nos revela o nome oculto de Deus. Assim o exprime João: «Deus é amor. Nisto se manifestou o amor de Deus em nós: Deus mandou ao mundo o seu Filho unigênito, parque nós tivéssemos a vida por meio dele. Nisto está o amor: não fomos nós que amamos Deus, mas ele que nos amou e mandou o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados» (1Jo 4,8-10). O nome de Deus é misericórdia, é ágape. Estamos como colocados diante da infinita luz que emana do rosto de Deus e que investe toda realidade criada, o mundo e cada um de nós. O esplendor do ágape nos revela quem é Deus. Mas não é uma luz inacessível, que diante da qual se permanece como mudos espectadores, incapazes até de pousar o olhar sobre este esplendor. Deus é amor porque «mandou ao mundo o seu Filho unigênito», «parque nós tivéssemos a vida por meio dele… como vítima de expiação pelos nossos pecados». O esplendor do amor de Deus nos envolve, nos atrai porque nos é revelado através do Filho, aquele que assumiu a nossa própria carne e ofertou esta carne pela salvação do mundo. Um dia Jesus disse a Nicodemos estas palavras: «Deus amou de tal forma o mundo que deu o ser Filho unigênito, para que todo aquele que nele crer não morra, mas tenha a vida eterna» (Jo 3,16). Deus é amor porque contém e cuida na sua infinita misericórdia de todo o mundo, e cada um de nós e isto para doarmos a vida e arrancarmos de toda forma de morte.
Acolher este amor em nós e transforma-lo em vida é crer no nome de Jesus. Mas isto nos revela também o que significa amar. Para o discípulo de Cristo amar não é antes de tudo um movimento horizontal que me abre para o alto, um ato de vontade benévola com o qual acolho o outro. Certamente o outro, o irmão é o ponto de chegada, o espaço no qual se realiza e toma forma o amor. João o recorda quando diz: «Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus: e quem ama nasceu de Deus e conhece a Deus. Quem não ama, não conhece a Deus» (1Jo 7,8). Mas João nos torna consciente que o amor, enquanto o próprio nome de Deus, pode ter só nele a fonte e a origem. Então para o discípulo amar é antes de tudo reconhecer esta origem e tomar consciência que é possível amar Deus e os irmãos só no momento no qual se descobre o amor que o próprio Pai em Jesus se dirige para cada um de nós. Não somos os protagonistas do ágape, mas só os beneficiários e os testemunhas: «Nisto está o amor: não somos nós que amamos a Deus, mas é ele que nos ama» (1Jo 4,10). O amor de Deus nos precede sempre, protege o nosso amor: ele é uma pobre resposta a esta infinita caridade que desce sobre nós.

O Espírito de Deus
Para permanecer radicados na vida do discípulo, a fé e o amor necessitam de um terreno estável e fecundo. E este é dado pelo Espírito de Deus: «Quem observa os seus mandamentos permanece em Deus e Deus nele. Nisto conhecemos que ele permanece em nós: pelo Espírito que nos é dado» (1Jo 3,24). A fé e o amor adquirem uma dimensão interior graças ao dom do Espírito que é a garantia, o sigilo da comunhão com Deus. Só quem se deixa penetrar pelo Espírito de Deus pode adquirir um olhar que vai além das aparências e além das ambiguidades da história. João nos coloca em vigilância sobre aquele que tenta apoderar-se da história, dos acontecimentos, do mundo e sobretudo do coração do homem para semear maldade e engano. Para João esta realidade que age de modo enganador na história tem um nome: «Este é o espírito do anticristo que, como ouvistes dizer, ele vem, mas ele já está no mundo» (1Jo 4,3). Dar a este espírito de engano o nome de “anticristo” significa tomar cuidado da radical ambiguidade com o qual ele age: não só se contrapõe a Cristo, mas assume como máscara o rosto de Cristo. Este é o engano mais perigoso porque utiliza o nome de Jesus para transmitir falsidade: tem falsos profetas que falam em seu nome e transmite um “espírito” de mentira que segue a lógica idolátrica do mundo. O seu fascínio é tão sutil a ponto de não permitir sempre um pronto discernimento. Isto é possível só mediante o Espírito de Deus porque só o Espírito desmascara o engano contido no anúncio do anticristo: e isto é esvaziar o próprio mistério da encarnação do Filho, a revelação de um Deus que toma a nossa carne para compartilhar em tudo a nossa humanidade e doarmos a vida de Deus: «Nisto podes reconhecer o Espírito de Deus: todo espírito que reconhece Jesus Cristo vindo na carne, é de Deus; todo espírito que não reconhece Jesus, não é de Deus» (1Jo 4,2-3). A humanidade de Deus é o grande escândalo que deve ser removido. Mas se Deus é sem o rosto humano, se Deus não se imerge nas viradas da história, então a fé se torna ideologia e gnose, um modo de pensar ou viver e não o encontro e a comunhão com a qual Deus tanto amou o mundo a ponto de dar o seu Filho. É uma tentação que atravessa toda a história do cristianismo e pode atacar e comprometer radicalmente a identidade do cristão. O verdadeiro lugar em jogo é a profissão de fé em Jesus Cristo vindo na carne. Esta fé, que é a base da regra do cristão, não só nos abre para a própria vida de Deus, mas se verifica e se atua no amor recíproco, gratuito e solidário. A carne de Cristo, a sua divina-humanidade, são a garantia do crer e do amar.

Para continuar a reflexão
Como discernir hoje, a partir dos nossos estilos de vida ou de certas lógicas através dos quais julgamos, o engano do “espírito do anticristo”? Quando se opera uma mundanização na vida do discípulo de Cristo e quando o evangelho se transforma em simples ideologia?
O que significa “crer no nome de Jesus” e como as escolhas quotidianas podem testemunhar esta fé?
Existe um real conhecimento do amor de Deus que nos precede e que funda os nossos relacionamentos fraternos? Na tentativa de amar um irmão ou uma irmã temos consciência que não somos nós os protagonistas do amor?

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