sábado, 21 de abril de 2018

6 - Amar na verdade (1 Jo 3,11-24) – Ler na Bíblia.

 Da fé em Deus l’amore fraterno
O fundamento da nossa vida cristã consiste no dom que Jesus deu a sua vida por nós (cf. 1Jo 3,16). É o dom do Filho que confirma a eterna aliança entre Deus e os homens; uma aliança que para ser respeitada exige que os próprios homens por sua vez se doem a vida reciprocamente: nisto demostram serem irmãos e filhos de Deus.
João insiste sobre a íntima ligação que existe entre a nossa condição de filhos de Deus e a retidão da nossa vida moral, ou seja, a fidelidade ao dúplice mandamento da fé em Jesus e do amor fraterno. É da fé no poder do dom de Deus em Jesus Cristo que deriva a ação ética e não vice-versa. Se é verdade que a observância dos mandamentos permite permanecer em Deus, é ainda mais verdade e profundo que o que poderia resultar da obra humana é na realidade só o fruto do dom de Deus.
O critério para compreender se vivemos realmente como filhos de Deus, é a caridade fraterna fativa. Questa é a mensagem (1Jo 3,11) que os destinatários da carta ouviram “desde o princípio” e é a palavra que constitui a comunhão eclesial (1Jo 1,3). A alternativa à caridade é um outro princípio, o de Caim, que faz prosseguir a história humana em suceder-se de atos de violência e que, para quem se professa cristão, expulsa realmente da comunhão eclesial. As obras manifestam a verdadeira fé e a fidelidade de cada um, o ser de Deus ou do Diabo.
Siguamos agora, passo a passo, versículo por versículo, o pensamento de João.

Comentário
v.12 «Não com Caim, que era do Maligno e matou seu irmão»: o mandamento do amor recíproco é ilustrado por contraste através de um exemplo de ódio fratricida parte da Bíblia, Caim contra Abel. Na tradição bíblica Caim é o tipo de quem não crê, de quem se rebela contra Deus e de quem é avarento; aqui se faz o tipo de quem odeia. João exprime um juízo moral sobre os atos de Caim e sobre os de Abel o justo, que na epístola vem significativamente indicato só com la expressão “seu irmão”. Quem se deixa inspirar pelo Maligno é por sua vez homicida como Caim e espalha ódio dentro da comunidade cristã. O injusto se revela na inveja e no ciúme, acontecimentos mundanos que penetram muito nas comunidades cristãs e as deformam.
v.13 «Não vos admireis, irmãos, se o mundo vos odeia»: o mundo não somente “não conhece” os filhos de Deus, mas os odeia. Assim como Caim odiou Abel o justo, o mundo odeia os justos e os persegue (cfr. Mt 5,10-12). «Saibam que antes de vós [o mundo] odiou a mim» (Jo 15,18), Jesus advertiu os seus discípulos no seu longo discurso de despedida.
v.14a «Nós sabemos que passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos»: o autor liga a passagem da morte para a vida com o amor fraterno, que realmente é, prova e confirma: o amor pelos irmãos não é a causa, mas é o sinal que se possui a vida divina. Ao contrário, é come Caim, «quem não ama permanece na morte» (1Jo 3,14b). Esta passagem da morte do pecado para a vida divina é acontecido no passado através da iniciação cristã e no presente continua com os seus efeitos. Nesta breve afirmação da epístola ressoam as palavras de Jesus citadas no quarto evangelho: «Quem escuta a minha palavra e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna e não será condenado, mas já passou da morte para a vida» (Jo 5,24).
«Porque amamos os irmãos»: o exercício da caridade fraterna é o sinal de riconhecimento que alguém é nascido de Deus (cfr. 1Jo 3,10; 4,7). Santo Agostinho sintetiza de modo luminoso: «Ninguém sonde os outros: cada um examine-se a si mesmo: se encontrar a caridade fraterna, esteja certo que já passou da morte para a vida». (Comentário da epístola  aos Parti, 5,10)

v.15 «Quem odeia o próprio irmão é homicida»: quem odeia não somente provoca a morte do irmão, mas é também causa da sua própria morte. Ele é suicida, porque destrói a vida divina que leva em si.

v.16 «Nisto conhecemos o amor, no fato que ele deu a sua vida por nós»: João  procede ainda por contraste: o ódio homicida de Caim contrapõe ao amor de Cristo que  oferece a sua vida por nós (cf. Jo 10,11.15.17.18). O gesto de Jesus que leva ao cumprimento a sua missão de Filho no Dom de si por amor é a fonte e o modelo do estilo de vida dos fiéis. O empenho ético se funda sobre estatuto originário dos fiéis, crentes no amor de Cristo porque o fizeram experiência: «conhecemos o amor». O amor “de Deus” que se derrama sobre quem observa a sua palavra (cf. 1Jo 2,5) e que se exprime tornando-nos seus filhos (cf. 1Jo 3,1), tem a sua fonte última em Jesus Cristo: é mediante Jesus Cristo que vem a nós a graça de dar a nossa vida pelos outros. O dom da nossa vida que fazemos aos irmãos participa da mesma oferta eucarística de Jesus. Com a seguinte diferença: se a oferta de Jesus é uma ação livre, para nós é ao contrário uma obrigação que prorrompe da nossa ligação com Jesus. Por isto «também nós devemos dar a vida pelos irmãos» (1Jo 3,16).
“Também nós”: é chamado o mandamento do amor fraterno formulado por Cristo: «amai-vos uns aos outros como eu vos tenho amado» (cf. Jo 15,12). João o trae logo depois uma aplicação prática no v.17. «Não precisa, de fato, ‘amar Deus’ e nem ‘amar Jesus’; precisa amar o outro com o mesmo amor de Jesus. O lugar do homem é o lugar de Deus. […] Amar o outro é amar Deus; atentar a vida do outro é atentar a Deus» (Y.Simoens).
A verdade da fé deve ser passada pelo cadinho da ação. O autor da carta, tomando logo um exemplo concreto de caridade fraterna (cf. 1Jo 3,17), exprime a realidade da fé, o que a torna verdadeira. Por experiência, sabemos que é muito fácil amar os irmãos de modo geral, enquanto é mais difícil amar o próprio irmão que está próximo de nós … Mas é justamente isto que cada um deve está atento.

v.17 «como pode o amor de Deus permanecer nele?»: se entendido como genitivo de qualidade, a expressão “amor de Deus” equivale a amor divino; se entendido como genitivo subjetivo, se trata de um amor que tem a sua fonte e o seu modelo em Deus, manifestado-se a nós em Jesus Cristo seu Filho. Se falta a obra concreta de fraternidade cristã, então o amor de Deus não pode permanecer em nós e também nós mesmos não podemos permanecer em Deus.

v.18 «Filhinhos, não amemos com palavras nem com a lingua, mas com os fatos e de verdade»: esta exortação está em ampla polêmica com os mestres do erro, os gnósticos do herege Cerinto, contra quem se lança a epístola. No sentido igualmente polêmico, se pode ler Gc 2,15-16: «Se um irmão ou uma irmã estão sem roupas e desprovidos do alimento quotidiano e alguns de vós diz a eles: ‘Vai em paz, aquecei-vos e saciai-vos’, mas não dás a eles o necessário para o corpo, que adianta?». O amor que se nutre só de palavras e de caráter abstrato e não se traduz em fatos, é pura hipocrisia, e revela a esterilidade da nossa fé. Comenta s. Agostinho: «Se ainda não estai pronto a morrer pelo irmão, etejas disposto a dar ao irmão um pouco dos teus bens. A caridade comove o teu coração, de tal modo que te faz agir não com vaidade mas com muita misericórdia; então a tua atenção se voltará sobre quem se encontra em necessidade. Se de fato não dás o supérfluo ao irmão, como poderás dar para ele a tua vida?» (Comentário da Primera carta de João, V,12).
«Na verdade»: na linguagem de João a expressão se relaciona à Ideia da revelação transmitida por Cristo e designa a ação que se inspira na verdade manifestada por ele. Verdade não é tanto o nosso reto conhecimento de Deus, quanto a fidelidade e a estabilidade do próprio Deus. Sobre esta verdade se funda a nossa fé e nesta verdade a nossa fé nos torna participantes.

v. 19a «Desse modo saberemos que estamos do lado da verdade e diante de Deus tranquilizaremos o nosso coração»: com a expressão “nascidos da verdade” João  tranquiliza os cristãos que cumprem o mandamento do amor (“Desse modo” equivale a “no amor fraterno”) de viver em comunhão com Deus. Pelo fato que nos comportamos retamente nos tomamos consciência que «estamos do lado da verdade», verdade que é a mensagem de Cristo escutada: «Quem é da verdade, escuta a minha voz» (cf. Jo 18,37).

v.20 «mesmo que a nossa consciência nos reprove»: O único modo no qual os homens podem ter uma consciência que não os condenem é observar os mandamentos de Deus, mas a nostra consciência conhece também o pecado, a fraqueza ou as inadvertências… No caso se a nossa consciência nos reprovar por qualquer pecado, não deixemo-nos  perturbar, porque Deus, o qual conhece tudo, dá um julgamento mais iluminado e justo do que aquele dado pela nossa consciência (coração). ReaImente, somente diante de Deus podemos encontrar paz: estar diante d’ELE purifica as intenções de tudo isto que nós chamamos “amore”.

v.20: «Deus é maior do que a nossa consciência, e Ele conhece todas as coisas»: o fato de que Deus conheça todas as coisas, também os desejos e os pensamentos do nosso coração (cardiognose divina), não toma um controle totalitário de sua parte, mas um senso de segurança para o homem para o reparo das reprovações do próprio coração e de todos os modos da sua mau consciência. Não devemos ter medo por causa disso: Deus é muito maior do que os nossos julgamentos mesquinhos. Na sua liberalidade, Ele está sempre pronto a perdoar. «O cristão repreendido pela sua consciência, não só confirma a se mesmo que Deus conhece também as suas ações de amor, mas edifica a sua confiança também no mar da compreensão e da misericórdia divina, benigna com todos» (R. Schnackenburg). Deus é maior porque é criador e juiz de todas as coisas; é maior porque conhece todas as coisas, mais precisamente o que faz o nosso coração; é maior  porque a nossa consciência, o nosso templo interior, é a sua imagem.
Mais uma vez, comenta magnificamente s. Agostinho: «Tu és capaz de escondere o teu coração aos homens, esconde-o a Deus, se podes. Como poderáis  esconde-lo a Ele, a quem um certo pecador, temeroso, confessou: ‘Onde encontrarei um rifúgio, longe do teu espírito, longe do teu rosto?’ Esta pessoa procurava um lugar para onde fugir e livrar-se do gulgamento de Deus, mas não encontrava. Onde não está Deus? ‘Se subo até ao céu, lá tu estás; se desço aos abismos, tu estás presente’ (Sl 138, 7-8). Para onde irei, para onde fugirei? Se queres um conselho, quando quizeres fugir dele, fugi para ele. Fugi para perto dele com confiança, e não se escondas do seu olhar: nada poderás fazer, enquanto não abrires para ele com confiança o teu coração» (Comentário, cit., 6,3).

v.21 «Caríssimos, se a nossa consciência não nos condena, sentimos confiança para nos dirigirmos a Deus»: se o nosso coração não nos dá o tormento da mau consciência, fica espaço só para a confiança, a parresía, isto é, o falar franco e sincero que exprime em ser bem sucedido na comunicação entre Deus e o nosso coração. Se nutre esta atitude nos relacionamentos com Deus quando se cultiva a oração, acompanhada no guardar os mandamentos de Deus e de um modo de viver conforme à Sua vontade. Podemos assim nos voltar para Ele com a forte convicção que Ele nos acolhe com amor e nos considera sempre seus filhos. A “plena confiança” é por isso determinata pela certeza do crente de ser atendido por Deus em Jesus Cristo: «Qualquer coisa que pedires em meu nome, eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho. Se me pedires qualquer coisa no meu nome, eu o farei» (Jo 14,13-14; e cf. Jo 15,7; Jo 16,23-24.26).

v.22 «e qualquer coisa que pedimos a recebemos dele, porque osbervamos os seus mandamentos e fazemos aquilo que é do seu agrado»: A observância dos mandamentos demonstra o mútuo amor e a recíproca aliança entre Cristo e os seus fiéis. A fé e a caridade são inseparáveis, não porque a fé seja um ato dependente da atividade do homem, mas porque ela entra também no mandamento: «que creiamos no nome do seu Filho Jesus Cristo e nos amemos uns aos outros» (cf. 1 Jo 3,23).

Para continuar a riflexão
Pela Primeira carta de João é importante ser “da verdade”. Se vem da verdade se vive uma vida estando “da parte justa”. De onde provém os meus pensamentos, as minhas palavras e os meus gestos?
«A justiça é o primeiro caminho da caridade ou, como disse Paulo VI, é a ‘medida mínima’ dela, parte integrante daquele amor com os fatos e na verdade (1Jo 3,18), a qual exorta o apóstolo João. De uma parte a caridade exige a justiça e o reconhecimento e o respeito dos legítimos direitos dos indivíduos e dos povos. Ela se aplica na costrução da ‘cidade do homem’, segundo direito e justiça. Também a caridade supera a justizia e a completa na lógica do dom e do perdão. A ‘cidade do homem’ não é aprovada só pelas relações de direitos e de deveres, mas ainda mais e primeiramente da relações de gratuidade, de misericórdia e de comunhão. A caridade sempre manifesta também nas relações humanas por amor de Deus, ela dá valor teologal e salvifico a todo empenho de justiça no mundo» (Bento XVI, Caritas in veritate, 6). Advirto uma tensão em mim e na minha comunidade entre exigência de justiça e prática da caridade? As vivo interconnesse, ou oscilo entre uma suposta justiça e uma caridade superficial? A minha ação caritativa é orientata a ter uma incidência social, política, econômica trasformadora da ‘cidade do homem’?
«A parrésia se tematiza como liberdade da palavra na oração, como confiança que não admite dúvidas. […] A vontade de Deus aceita e cumprida forma também a oração, tornando-se o objeto. […] Assim como a caridade tem como fruto o “conhecimento de ser da verdade” (cfr. 1Jo 3,19), A obediência aos mandamentos tem como fruto o atendimento da oração» (A.Scarano, in Y.Simoens). Vivo a minha oração como diálogo livre e franco com Deus? Que espaço existe nela para a escuta acolhedora da Sua vontade?
A ágape exprime contemporaneamente o dom de si de Cristo a cada pessoa debaixo do sol, a compaixão humana pelo próximo na indigência, o amor que temos para com Deus e o amor que por primeiro Deus tem para conosco. Conheço todas estas dimensões da caridade? João exorta a confiar sempre na bondade divina e a ser perseverantes na observância dos mandamentos resunidos em um só: «Este é o mandamento: que acreditemos no nome de seu Filho Jesus Cristo e nos amemos uns aos outros… Quem observa os seus mandamentos permanece em Deus e Deus nele. E por isto reconhecemos que ele pemanece em nós: pelo Espírito que nos é dado» (vv. 23-24). Este único mandamento tem duas faces: a fé em Jesus Cristo, Filho de Deus, e o amor recíproco. São as duas dimensões da regra dos cristãos: a dimensão vertical, que se exprime e se atua na fé cristológica, e a dimensão horizontal, que se vive nos relacionamentos de amor recíproco na comunidade dos irmãos. Estou atenta a esta dúplice dimensão no meu modo de ser cristã ou sou desequilibrada sobre uma mais do que a outra?
Conhecer o amor recebido significa tomar consciência do amor que nos é dado. Recordar quer dizer “levar ao coração”. Se o coração recorda este amor, se tranquiliza. Portanto, conhecer e reconhecer o amor recebido nos traz antes de tudo paz ao coração e capacidade de amar. Sem conhecimento do amor não podemos amar: seria só um dever moral. Quanta parte tem nas minhas escolhas e no meu comportamento o desejo de corresponder ao amor recebido?
“Sim, Eu sinto, mesmo se tivesse na consciência todos os pecados que se podem cometer, andarei, com o coração despedaçado pelo arrependimento, a lançar-me-ei entre os braços de Jesus, porque sei quanto ele ama os filhos pródigos que retorna para Ele. Não é porque o bom Deus, na sua misericórdia preveniente, preservou a minha alma do pecado mortal, que eu me levanto e vou a Ele com confiança e amor”. (s. Teresa do Menino Jesus) Recordo a ação misericordiosa preveniente de Deus na minha história? Sei contar e testemunhar

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